Alguns Trechos do Livro


          “Sempre que escrevo, vem-me a pergunta: seria ensaio, crônica, conto, história curta?  Quem sabe, história curta resvalando para conto ou crônica?  Poderia ser também uma crônica-ensaio ou conto-ensaio.  No fundo a verdade é que os chamados “gêneros literários” estão esfacelados hoje em dia. 

          Mas gosto mesmo é de minhas “memórias-ficcionais” inspiradas nas andanças pelos fundões deste mundo. 

          Mas se literatura é espécie de estranhamento que nos leva a um maior conhecimento, vou tentar escritas mais elaboradas. 

O texto será diferente.  Inspirado em conceitos como Mimésis, Arquétipos; incursões pela Filosofia, Teoria Literária e até Psicanálise. 

Será construído palavra por palavra, linha a linha, parágrafo por parágrafo.  Evoluirá tal a construção de uma pirâmide, pedra a pedra. 

          Difícil resolução.  Escrever sobre o que vejo por aí, é sempre mais fácil.”

De A Memória Intrusa.


          “Um triste amanhecer.  Os últimos acordes de Albinoni. 

          Santoro nem chegou a escutar as rezas do Cardeal – ataque cardíaco fulminante: ‘Revertere ad locum tuum’.  Partiu junto com seu amigo, o inestimável Francisco Borba.  Assim foram as palavras de um futuro membro desta Egrégia Corte, a ser renovada com sangue novo, graças às duas vagas da Providência Divina – agora, a voz do governador, mãos trêmulas, fungando, suando frio, só um pensamento: ‘ao pó retornarei!’.”
De A morte de Ivan que não era Ilitch.

 
 
          “Meus pensamentos oscilavam entre o Fantástico e o dito Real.  Um pé no mundo regido mais ou menos harmoniosamente por um sistema de leis, princípios, relação de causa e efeito, psicologias definidas e geografias bem cartografadas.  O outro pé flutuando no oposto a este realismo, num mundo que não reside nas leis, mas nas suas exceções, onde imperam ordens mais secretas e menos comunicáveis.”
De Miragens de Paraty.



“Entre as estantes, um velho ia se arrastando, olhos colados nas lombadas.  Ao me ver, sorriu e comentou:  Vou anotando os nomes dos livros que gosto.  Em casa passo tudo a limpo no caderno – minha biblioteca.  Um dia, quando tiver dinheiro, vou comprar tudo.” 

De Devaneios no Tempo.


“Parece que existe um grande esforço em fortalecer o pensamento de uma nota só, onde Cultura, Educação e Ciência são valores menores, quase entraves ao fortalecimento dos grupos dominantes.  As nomeações para ministérios como Cultura, Educação e Ciência & Tecnologia são sérias evidências desta perversa posição.  Por outro lado assistimos, pasmos, aos investimentos maciços de estatais ou firmas intimamente ligadas aos “negócios” governamentais, em projetos do tipo “chapa-branca”, sejam blogs, portais na internet, televisão, jornais ou mesmo “eventos culturais” dos amigos da corte.”
De Monteiro Lobato e o Presidente Negro.

          “Última visão de Sanney, ou seja lá quem era: sumindo na multidão, mesma blusinha cerzida, rosto pálido, tímido aceno.  Expressão de dor.  Verdadeira nuvem de suor e odor de cachaça envolvendo-a, protegendo-a, cantando: Agora é cinza / Tudo acabado / E nada mais...
De Aporia
 
Por aveludadas texturas, cores que se atraem, que se traem
na imaginação do ensejo a fruição de desejo
romper rendas, atravessar teias
escorregadias margens
aveludadas texturas.
De A Galinha Matada.

          “Frio insensível espírito errante.  Sete continentes a percorrer.  Sete véus a desvendar.  Carnes vibrantes a revelar...
          A hora é de partir.  Rumo errático na chegada sem fim.
          Apenas tênue brilho estelar. 
          Apenas uma claraboia a iluminar.”
De Errâncias.

          “E assim, Veneza, a Sereníssima.
          A música de Vivaldi, o inesquecível Il Cimento dell’Armonia e dell’ Inventione pelo Interpreti Veneziani.
Um bellini na Piazza San Marco no final do verão.”
De Veneza.

“No dia 12 de julho de 2012, a uma e trinta da madrugada ensolarada, o Capitão do navio, Valentin Davydyants, anunciou: O GPS marca 90 graus, zero minutos!  Missão final: Polo Norte.

Desde 1977, quando o primeiro quebra-gelo nuclear aqui aportou, este foi o nonagésimo segundo navio a chegar a esta latitude extrema, com representantes de vinte e quatro nações, vindos de todos os continentes.

Missão de paz, mas também de defesa do ecossistema tão ameaçado.”
De Extrema Latitude: Madrugada Ensolarada.

 

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